A evolução política e social foi tema da aula inaugural do curso de "Formação Política: futuros vereadores", promovida pela Escola do Legislativo Deputado Lício Mauro da Silveira, em parceria com a Escola do Legislativo Marcos Mannes, da Associação dos Vereadores do Vale do Itapocu (Avevi), na noite desta quarta-feira (22), na Uniasselvi de Guaramirim, Norte do estado.
Proferida pelo professor Ricardo Virgilio da Silva, doutor em Ciências Sociais, a palestra marcou o início do curso quinzenal de 12 encontros, com data de termino agendada para 30 de setembro. Ricardo trouxe questões de natureza conceitual e histórica envolvendo o tema Política, além de abordar o panorama atual brasileiro. “Considero a política uma arte nobre, superior. A grande verdade é que sem a política não conseguiríamos viver juntos”.
O professor declarou que, quando pensa em evolução social, pensa no tema da persecução da igualdade social, não só a partir dos ideais iluministas da Revolução Francesa, mas desde a antiguidade clássica, na Polis Grega. A evolução política, por seu turno, remete ao tema da legitimidade e da democracia, segundo ele. “Falar em política, no meu ponto de vista, só é frutífero quando se fala em um determinado tipo de regime democrático ou em democracia representativa. Sistema muito criticado, mas a meu ver, incontornável.”
Ricardo fez um resgate histórico e lembrou ao público de, aproximadamente, 200 pessoas, que a democracia como organização de vida política na sociedade surge com a ideia da democracia direta – Polis Grega, onde a ideia da igualdade política era tão acentuada que o mecanismo para escolher a formação dos conselhos era feita por sorteio.
Democracia representativa
De acordo com o palestrante, o problema da democracia na Polis Grega, entretanto, era a restrição da cidadania a um número pouco significativo de pessoas. A noção de cidadania e democracia, de igualdade política, foram se transformando. Com o surgimento do estado moderno, a concepção de cidadão de expandiu. Passaram a existir os estados nação, os territórios tornaram-se maiores e, no século XVII, pensadores ingleses, como Thomas Hobbes e John Locke começaram a enxergar uma nova representação política.
Já não era mais possível reunir todos os cidadãos devido ao aumento da população e à transformação geográfica. A escolha, pela via do voto, foi a saída para eleger seus representantes. Com o surgimento do estado moderno, passa a se desenvolver a ideia, que só vai se consolidar no século XVIII, na França, de que o corpo político pode ser dividido (executivo e legislativo).
Crise brasileira atual
“A democracia representativa é a ideia de que cada cabeça vale um voto e isso, hoje, passa por uma crise real. Uma das razões dessa crise está associada, mais especificamente, à democracia eleitoral.” Segundo Ricardo, a corrosão desse sistema não é a legitimidade eleitoral. O problema é contar somente com ela para a eleição de representantes.
“Novas formas de legitimidade estão aflorando. A democracia representativa precisa de outros agentes, como, por exemplo, a legitimidade pela imparcialidade”, declarou.
Como recompor o sentimento de legitimidade da composição eleitoral, de democracia em função de ideais, foi a questão levantada por ele à plateia. “No Brasil vivemos um sentimento de desconfiança assombrosamente alta. A democracia não combina com confiança cega, mas não pode existir uma desconfiança extremada como a que estamos vivendo.”
O processo cultural formativo, que vem desde os tempos da colonização e, depois, com a formação dos partidos políticos é o mal que nos assombra, de acordo com Ricardo. “As pessoas tomam os partidos como seus, num ethos patrimonialista, clientelista, nepotista. Essa matriz patrimonialista da política brasileira está no limite. A carga pesada de denúncia é mais evidente do que já foi em toda a nossa história.”
A contratação de funcionários qualificados, por meio de concurso, foi apontada pelo cientista social como um dos pontos importantes para a legitimação do sistema democrático contemporâneo. Ele ressaltou que iniciativas como a deste curso de formação são saídas para se encontrar a linha de igualdade. “Esta iniciativa caminha para isto. Preparar as pessoas para assumir as instituições, mudar a maneira como as pessoas interagem com a política, a maneira como o vereador concebe a si mesmo”.
Representantes parlamentares
O vereador de Jaraguá do Sul, Arlindo Rincos, coordenador da escola do Legislativo da Avevi, ressaltou a importância da parceria das duas escolas legislativas para a formação dos legisladores municipais, servidores de câmaras e lideranças comunitárias. “A iniciativa do curso é mais do que necessária. A Política em seu conceito básico de ciência, do que é público, não está sendo cumprida. Pensar e agir sempre em prol do coletivo, independentemente de ideologias, é o papel da política.”
Rincos destacou que, colocar-se em pleito eleitoral pressupõe a consciência do cargo que se pretende assumir e a responsabilidade para assumi-lo. “Acredito que a política séria funcione como uma corrente. Na medida em que um for seguindo os bons exemplos do outro, a política funcionará.”
Giovanni Tonet, vereador de Massaranduba e presidente da Avevi, frisou a necessidade de formação contínua para a construção do processo de gestão e legislação coletivo.
O coordenador da Escola do Legislativo Deputado Lício Mauro da Silveira, Antoninho Tiburcio Gonçalves, lembrou da disciplina de educação moral e cívica oferecida no ensino fundamental anos atrás, não mais ofertada, e lamentou a falta desse tipo de formação. “Desde cedo aprendíamos sobre o papel dos gestores públicos, sobre conceito de política e conhecíamos as particularidades de cada Poder. Temas importantes que auxiliavam e orientavam para o engajamento social e levavam em consideração valores éticos”.
Formação Política da Escola do Legislativo
O curso de Formação Política está inserido nas atividades abrangidas pelo subprograma Política e Cidadania do Núcleo de Formação de Agentes Políticos da Escola do Legislativo da Assembleia Legislativa de Santa Catarina. O núcleo tem como objetivo subsidiar a atuação dos legisladores municipais e demais lideranças proporcionando espaços de reflexão e qualificação.
O palestrante
Ricardo Virgilino da Silva é professor associado IV da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), onde coordena o Núcleo de Estudos do Pensamento Político (NEPP). Tem experiência na área de Ciência Política, com ênfase em Atitude e Ideologias Políticas e Teoria Política Contemporânea. Atua, principalmente, nos temas: republicanismo e teoria democrática, metodologia para o estudo da história do pensamento político, historicismo na teoria política, pensamento político brasileiro, sociologia política e teorias da ideologia.